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Autor: Leonardo Araujo Marques

  1. Pequeno Introito

Desde os primeiros dias de entrada em vigor do novo Direito da Insolvência, por ocasião do fim da vacatio legis da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, sobressaiu-se um enorme conflito entre o princípio da preservação da empresa e os privilégios que cercam o crédito tributário, especialmente a sua não subsunção ao concurso de credores estabelecido pelo processo de recuperação judicial.

A intenção original do legislador, de permitir o regular prosseguimento das execuções fiscais contra o devedor em recuperação judicial, sem nenhuma interferência do Juízo da Recuperação, não poderia estar mais clara, consoante se extrai da conjugação dos artigos 6º, §7º da LFRE e 187 do Código Tributário Nacional, a conferir:

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.

(…).

§ 7º As execuções de natureza fiscal não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial, ressalvada a concessão de parcelamento nos termos do Código Tributário Nacional e da legislação ordinária específica.

______________

Art. 187. A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento. 

Entretanto, a jurisprudência majoritária, pautada exclusivamente no princípio da preservação da empresa, positivado no art. 47 da LFRE, consolidou-se em sentido oposto, retirando do Juízo da Execução a possibilidade de determinar atos de constrição contra o patrimônio do devedor em recuperação judicial. Vejamos:

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AGRAVO INTERNO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. EXECUÇÃO FISCAL. ATOS EXPROPRIATÓRIOS ANTERIORES AO DEFERIMENTO DA RECUPERAÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO UNIVERSAL.

1. Os atos de execução dos créditos individuais e fiscais promovidos contra empresas falidas ou em recuperação judicial, tanto sob a égide do Decreto-Lei n. 7.661/45 quanto da Lei n. 11.101/2005, devem ser realizados pelo Juízo universal. Inteligência do art. 76 da Lei n. 11.101/2005. Precedentes.

2. Por outro lado, o prosseguimento da execução fiscal e eventuais embargos, na forma do art. 6º, § 7º, da Lei 11.101/2005, deverá se dar perante o juízo federal competente, ao qual caberão todos os atos processuais, exceto a apreensão e alienação de bens.

3. Na hipótese em que os atos de constrição judicial tenham ocorrido anteriormente ao decreto de quebra ou ao deferimento do pedido de recuperação, eles devem ser liquidados e, após a auferição dos valores, estes deverão ser revertidos à massa falida ou encaminhados ao juízo da recuperação. Precedentes.

4. O advento da Lei nº 13.043/2014 não altera o entendimento jurisprudencial pacificado no sentido de que compete ao juízo universal apreciar atos constritivos praticados contra o patrimônio de empresa recuperanda, ainda que oriundos de execuções fiscais.Precedentes.

5. Agravo interno não provido.

(AgInt no CC 147.485/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/02/2020, DJe 18/02/2020)

Em síntese, a orientação jurisprudencial dominante é no sentido de que o Juízo da Execução Fiscal não pode determinar a prática de atos de constrição contra o patrimônio do devedor em recuperação judicial e, ainda que este ato já tenha ocorrido, eventual produto da alienação deverá ser encaminhado ao Juízo da Recuperação Judicial.

A PRIMEIRA SEÇÃO do STJ, sobretudo a partir de precedentes da 2ª Turma da relatoria do Eminente Ministro HERMAN BENJAMIN, propõe uma revisão da jurisprudência edificada pelas Turmas de Direito Privado, destacando a inexequibilidade daquele entendimento.

A linha divergente defende que, aderindo o devedor em recuperação judicial ao parcelamento do passivo fiscal, todas as execuções fiscais serão suspensas por força do art. 151 CTN e o devedor terá, inclusive, como apresentar a certidão positiva com efeitos negativos reclamada pelo art. 57 da LFRE, abrindo caminho para que o plano aprovado pelos credores seja homologado pelo juízo da recuperação judicial.

Do contrário, não aderindo o devedor em recuperação judicial àquele parcelamento, há de se aplicar, literalmente, o §7º do art. 6º da LFRE, permitindo-se o regular prosseguimento de todas as execuções fiscais contra o devedor em recuperação, inclusive com possibilidade de atos de constrição determinados pelos próprios juízos das execuções fiscais, que deverão observar os princípios da preservação da empresa e da menor onerosidade.

Em contrapartida à continuidade das execuções fisacais contra o devedor em recuperação judicial, não se exigiria dele a certidão de regularidade tributária para fins de homologação do plano aprovado pelos credores privados, afastando-se a exigência do art. 57 da LFRE. Vejamos:

(…). 8. Dessa forma, deve-se adotar a seguinte linha de compreensão do tema: a) constatado que a concessão do Plano de Recuperação Judicial foi feita com estrita observância dos arts. 57 e 58 da Lei 11.101/2005 (ou seja, com prova de regularidade fiscal), a Execução Fiscal será suspensa em razão da presunção de que os créditos fiscais encontram-se suspensos nos termos do art. 151 do CTN; b) caso contrário, isto é, se foi deferido, no juízo competente, o Plano de Recuperação judicial sem a apresentação da CND ou CPEN, incide a regra do art. 6º, § 7º, da Lei 11.101/2005, de modo que a Execução Fiscal terá regular prosseguimento, pois não é legítimo concluir que a regularização do estabelecimento empresarial possa ser feita exclusivamente em relação aos seus credores privados, e, ainda assim, às custas dos créditos de natureza fiscal. 9. Nesta última hipótese, seja qual for a medida de constrição adotada na Execução Fiscal, será possível flexibilizá-la se, com base nas circunstâncias concretas, devidamente provadas nos autos e valoradas pelo juízo do executivo processado no rito da lei 6.830/1980, for apurada a necessidade de aplicação do princípio da menor onerosidade (art. 620 do CPC). 10. Recurso Especial provido para reformar o acórdão hostilizado.

(REsp 1488778/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/02/2016, DJe 30/05/2016)[1].

Em face dessa manifesta divergência, o tema foi afetado ao Plenário da Corte Especial do STJ, sob o nº 987[2], ocasião em que se decidirá sobre a “Possibilidade da prática de atos constritivos, em face de empresa em recuperação judicial, em sede de execução fiscal de dívida tributária e não tributária”. Confira-se:

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. EXECUÇÃO FISCAL. PRÁTICA DE ATOS EXECUTÓRIOS CONTRA O PATRIMÔNIO DA RECUPERANDA. LEI N. 13.043/2014. DIVERGÊNCIA ENTRE AS TURMAS DA PRIMEIRA SEÇÃO E A SEGUNDA SEÇÃO DO STJ. RECONHECIMENTO. SUJEIÇÃO À CORTE ESPECIAL. NECESSIDADE. INCIDENTE NÃO CONHECIDO POR RAZÕES DE CONVENIÊNCIA. OBSERVÂNCIA, DE OFÍCIO, DA PROVIDÊNCIA CONTIDA NO ART. 16 DO RISTJ. AFETAÇÃO À CORTE ESPECIAL PARA DIRIMIR O MÉRITO DA DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. (…).

3.1 A Segunda Turma, integrante da Primeira Seção, em recurso especial advindo de execução fiscal, perfilha o entendimento de que “a execução fiscal não se suspende pelo deferimento da recuperação judicial, permitindo-se a realização de atos constritivos, máxime quando evidenciada a inércia da empresa recuperanda em adotar as medidas necessárias à suspensão da exigibilidade dos créditos tributários, em especial, por meio do parcelamento especial disciplinado pelo art. 10-A da Lei n. 10.522/2002, incluído pela Lei 13.043/2014” (ut REsp 1673421/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 17/10/2017, DJe 23/10/2017). 3.2 A Segunda Seção, diversamente, em conflito de competência entre os juízos da recuperação judicial e da execução fiscal, reconhece a competência do primeiro, assentando que, embora a execução fiscal não se suspenda, os atos de constrição e de alienação de bens voltados contra o patrimônio social das sociedades empresárias submetem-se ao juízo universal, em homenagem ao princípio da conservação da empresa. A Seção de Direito Privado do STJ perfilha o posicionamento, ainda, de que a edição da Lei n. 13.043/2014  que acrescentou o art. 10-A à Lei n. 10.522/2002 e disciplinou o parcelamento de débitos de empresas em recuperação judicial  não descaracteriza o conflito de competência, tampouco tem o condão de alterar o entendimento jurisprudencial destacado, conforme decidiu a Segunda Seção por ocasião do julgamento do AgRg no CC 136.130/SP, Relator o Ministro Raul Araújo, Relator p/ Acórdão Ministro Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 13/5/2015, DJe 22/6/2015.

4. A divergência de posicionamento entre a Segunda Seção e as Turmas que integram a Primeira Seção é manifesta, o que, do ponto de vista da segurança jurídica e da isonomia, afigura-se absolutamente temerário, notadamente em atenção ao papel atribuído constitucionalmente ao Superior Tribunal de Justiça de uniformizar a jurisprudência nacional na interpretação da legislação federal.

5. Por razões de conveniência, não se conhece do Incidente de Uniformização Jurisprudencial e, de ofício, em atenção à providência contida no art. 16 do RISTJ, determina-se a afetação à Corte Especial do julgamento do presente conflito de competência para prevenir/dissipar a divergência jurisprudencial destacada no âmbito do STJ.

(IUJur no CC 144.433/GO, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/03/2018, DJe 22/03/2018)

Passados mais de 2 (dois) anos desde a afetação do julgamento da tese de uniformização da jurisprudência e da determinação de suspensão dos julgamentos relativos ao tema pelos Tribunais Inferiores, o Superior Tribunal de Justiça não dá sinais de que estamos próximos de uma solução definitiva.

O resultado dessa instabilidade não poderia ser pior, uma vez que o Instituto da Recuperação Judicial se transformou num eficaz instrumento de fraude fiscal, pois as Fazendas Públicas não conseguem receber por meio das execuções fiscais, muito menos dentro dos processos de recuperação judicial.

Nós, que atuamos no dia a dia das Varas Empresariais testemunhamos, pasmos e de mãos atadas, inúmeros devedores sem pagar 1 (um) centavo de tributos durante o período da recuperação judicial e, como essa circunstância não está prevista nos incisos do art. 73 da LFRE, não há como pedir a convolação dessas recuperações judiciais em falência, sobretudo quando as obrigações concursais, perante os credores privados, estão sendo cumpridas.

É nesse contexto de preocupação que desenvolveremos o presente artigo, não apenas detalhando os problemas, mas apontando soluções definitivas para o engrandecimento do Instituto Recuperacional.

  • A Tese Majoritária e os seus Percalços

Devemos, antes de seguir essa ou aquelaorientação jurisprudencial, ouvir a voz do bom senso e analisar pormenorizadamente cada detalhe, cada repercussão jurídica e econômica da adoção daquele entendimento.  Esse exercício nos fez compreender que, máxima vênia, como bem ressaltado pelo Ministro Herman Benjamim, precisamos “revisitar” a jurisprudência construída pela Segunda Seção do STJ. Analisemos juntos essas razões:

  • Recuperação Judicial não é Falência

O primeiro ponto a ser destacado é o equívoco em tratar a recuperação judicial como se falência fosse, lhes conferindo um mesmo tratamento. Sempre se faz necessário gizar que a Lei nº 11.101/2005 é dividida em 7 (sete) capítulos esomente o capítulo II está reservado para as “DISPOSIÇÕES COMUNS à recuperação judicial e à falência”, abrangendo do artigo 5º ao artigo 46.

Por sua vez, o capítulo III trata,apenas, da recuperação judicial, abrangendo do artigo 47 ao artigo 74, enquanto o capítulo V, que se estende do artigo 75 ao artigo 160, disciplina,exclusivamente, a falência.

As diferenças formais e materiais entre os institutos são topográficas e gigantescas, mas infelizmente são olvidadas em diversos julgados que, ao se acumularem, formam uma equivocada jurisprudência. Observemos o quadro abaixo:

FALÊNCIA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Os bens do devedor são arrecadados Não há arrecadação de bens do devedor
O pagamento dos credores concursais e extraconcursais é feito pelo juízo falimentar (art. 149 da LFRE) O pagamento dos credores, qualquer que seja a sua natureza, é feito diretamente pelo próprio devedor
Há ordem legal e inderrogável de prioridade de pagamento A ordem de pagamento é aquela estabelecida no plano de recuperação
O crédito fiscal é concursal (art. 83, III e VII, da LFRE e 186 do CTN) O crédito fiscal não é concursal (art. 68 da LFRE)
Encerram-se as atividades (regra) e afastam-se os administradores Prosseguem-se as atividades e mantém-se os administradores.
Há previsão legal para o princípio da indivisibilidade do juízo falimentar (art. 76 da LFRE) Não há previsão legal para a indivisibilidade do juízo da recuperação judicial

Parece-nos lógico concluir que não cabe ao Juízo da Recuperação Judicial determinar a prática de qualquer ato de constrição contra os bens do devedor em recuperação judicial,seja por absoluta falta de amparo legal, seja porque não tem natureza executiva, sequer havendoum mísero dispositivo na lei para autorizar o juízo recuperacionalarrecadar bens do devedor ou efetuar/intermediar o pagamento dos credores sujeitos ao concurso.

É preciso lembrar que muitos planos de recuperação judicial sequer têm previsão de alienação de bens do devedor como método de reestruturação e não existe uma ordem legal de pagamentos na recuperação judicial. Um credor quirografário pode receber antes de um credor trabalhista, assim como pode haver previsão de haircut para determinada classe de credores e não haver para outra. Aplica-se ao instituto da recuperação judicial o princípio freedomfromcontract.

Ora, diferente das falências, se não cabe ao juízo da recuperação judicial arrecadar e vender os bens do devedor ou mesmo efetuar o pagamento dos credores concursais, com muito mais razão não deveria ser competente quando o crédito não está sujeito ao concurso. Não faz sentido, não tem lógica.

Nas falências, como todos os bens do devedor são arrecadados, não há outra forma para o crédito fiscal ser satisfeito a não ser por meio do juízo falimentar, que deverá observar as ordens de preferências estabelecidas nos artigos 83 (créditos concursais) e 84 (créditos extraconcursais), bem como a regra prevista no art. 149, todosda LFRE.

Repise-se: o juízo falimentar é responsável pelo pagamento dos credores concursais e extraconcursais, inclusive os de natureza fiscal, por força dos artigos 83, incisos III e VII, 84, inciso V, parte final, e 149 da LFRE.

Já nasrecuperações judiciais é diferente, muito diferente!

Os bens do devedor não são arrecadados e a ordem de pagamento será aquela estabelecida no plano de recuperação judicial homologado, que não pode sequer tratar do crédito fiscal, uma vez que o Estadolato sensunão participa da negociação do plano de recuperação, por força do art. 68 da LFRE, revelando-se correta a opção do legislador em considerar as Fazendas Públicas como credoreshold out.

Sejamos repetitivos. Diferente da recuperação judicial, na falência há clara menção à sujeição do crédito tributário, por imperativo legal previsto no artigo 83, incisos III e VII, e no artigo 84, inciso V, parte final, da Lei 11.101/2005, combinado com o art. 186, § único, do CTN. Assim, o crédito fiscal deve concorrer com os demais créditos dentro da prioridade estabelecida pela legislação.

Por fim, como nas falências as atividades são encerradas e os administradores afastados, a LFRE estabelece que o juízo falimentar é indivisível e competente para conhecer de todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, consoante art. 76, inserido no capítulo exclusivo das falências. O mesmo não ocorre nas recuperações judiciais, uma vez que o devedor continua à frente dos seus negócios e atuando no mercado sob a direção dos seus próprios administradores.

Portanto, ontologicamente, é absolutamente inapropriado aplicar a sistemática falimentar aos processos de recuperação judicial. A falência é sim um processo de execução coletiva, enquanto a recuperação judicial não, podendo ser concebida como um processo sui generis, predominantemente cognitivo, cujo objetivo é a celebração de um acordo coletivo entre o devedor e seus credores, que permita, a um só tempo, a satisfação dos créditos e a preservação da empresa, evitando-se a falência.

  • A Ineficácia da Execução Fiscal Sem os Atos de Constrição

De que serve um processo executivo se o juízo não pode determinar a prática de atos de constrição contra os bens do devedor ou mesmo o pagamento do exequente, quando disponíveis recursos provenientes da alienação judicial dos bens do devedor?

No introito do presente artigo selecionamos um precedente da Segunda Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, julgado em 12/02/2020, representativo da jurisprudência majoritária, em cuja ementa está expresso que “Na hipótese em que os atos de constrição judicial tenham ocorrido anteriormente ao decreto de quebra ou ao deferimento do pedido de recuperação, eles devem ser liquidados e, APÓS A AUFERIÇÃO DOS VALORES, ESTES DEVERÃO SER revertidosà massa falida ouENCAMINHADOS AO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO”.

Perdoem-nos mais uma pergunta retórica: Qual o sentido de se autorizar o ajuizamento ou o prosseguimento de um processo de execução individual, fiscal ou não, se nele não pode haver a prática de atos de contrição e, na remota hipótese de existirem valores auferidos, nem mesmo o pagamento do exequente pode ser autorizado?

Ainda de acordo coma Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, caberia ao “Juízo Universal da Recuperação[3]dar prosseguimento àquelas execuções fiscais, determinando a constrição dos bens do devedor em recuperação judicial, na linha preconizada pelo enunciado 74 de Direito Comercial do CJF. Por todos, confira-se o entendimento da Segunda Seção sobre o tema:

AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA – EXECUÇÃO FISCAL E RECUPERAÇÃO JUDICIAL – COMPETÊNCIA DO JUÍZO UNIVERSAL – DELIBERAÇÃO MONOCRÁTICA QUE CONHECEU DO CONFLITO E DECLAROU A COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PRECEDENTES DA EG. SEGUNDA SEÇÃO. IRRESIGNAÇÃO DA FAZENDA NACIONAL.

1. Consoante orientação desta eg. Segunda Seção, a edição da Lei n. 13.043, de 13.11.2014, por si, não descaracteriza o conflito de competência porquanto apesar de a recuperação judicial não acarretar a suspensão das execuções fiscais, as decisões a respeito das constrições e das alienações dos bens da empresa executada, atingidos pelo processo executivo, deveriam se concentrar na competência do Juízo da recuperação. Caso líder: AgRg no CC 136130 / SP, Rel. Min. Raul Araújo, Relator p/acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, Dje de 22/06/2015. (…).

3. A Segunda Seção firmou entendimento no sentido de que o juízo onde se processa a recuperação judicial TEM COMPETÊNCIA PARA A PRÁTICA DE ATOS DE EXECUÇÃO RELATIVAMENTE AO PATRIMÔNIO DA SOCIEDADE AFETADA, FUNDAMENTADO TAL OBJETIVO NO DESIDERATO DE EVITAR A REALIZAÇÃO DE MEDIDAS EXPROPRIATÓRIAS INDIVIDUAIS QUE POSSAM PREJUDICAR O CUMPRIMENTO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO. (…).

(AgInt no CC 159.257/PE, Rel. Ministro MARCO BUZZI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/10/2018, DJe 06/11/2018)

Tal orientação, com fundamento único na teoria da preservação da empresa, é de complexa aplicação e vem deixando atônitos os diversos juízes que estão à frente das varas de execuções fiscais. Em alguns casos, talvez pensando estarem cumprindo a determinação do Superior Tribunal de Justiça, diversos juízos, estaduais e federais, chegaram a determinar o encaminhamento físico do processo individual de execução ao juízo da recuperação judicial. Foi um caos!

Impossibilitados de determinar atos de constrição contra os bens do devedor em recuperação judicial, os juízos das execuções fiscais não sabem o fazer, e não têm culpa disso, pois nenhuma das providências até hoje adotadas por eles se revelaram eficazes para a satisfação do crédito fiscal.

Em certas ocasiões os juízos fazendários improvisam e determinam a “penhora no rosto dos autos da recuperação judicial”, ignorando o fato de que, diferente das falências, nas recuperações judiciais não há arrecadação ou liquidação forçada de bens. Em outras, apenas encaminham um ofício ao juízo da recuperação comunicando a existência daquela execução fiscal, rogando para que algo seja feito.

Mas o que acontece depois dessa “penhora no rosto da recuperação judicial” ou do recebimento do ofício? Nada, absolutamente nada.

Queremos acreditar que, se bem entendida a orientação da Segunda Seção do STJ, após a informação do juízo fazendário, quer pela “penhora no rosto dos autos” ou por simples ofício, deveria o juízo universal determinar a intimação do devedor em recuperação judicial para pagar aquele crédito não sujeito ao concurso. Porém, isso não ocorre em razão da própria complexidade dos seus desdobramentos.

Caso o devedor em recuperação judicial não pague, o que poderia fazer o Juízo da Recuperação: determinar a penhora de algum bem, afastar os administradores do comando da empresa ou convolar a recuperação em falência?

Trilhemos o caminho menos drástico para não nos afastarmos do princípio da preservação da empresa, ou seja, imaginemos que o devedor em recuperação judicial não cumpra a determinação de pagamento daquele crédito fiscal e o juízo da recuperação determine a penhora de algum bem “não essencial”.

Após esse ato de constrição, será o Juízo da Recuperação Judicial o responsável pela realização da hasta pública e pelo pagamento do credor fiscal ou esses desdobramentos serão de responsabilidade do juízo fazendário?

As dúvidas não param por aí. Esses atos se dariam nos autos principais da recuperação judicial ou em um incidente satélite? Aliás, considerando que a origem de tudo é uma execução fiscal, esses atos observarão as regras da LFRE, do CPC ou da própria Lei de Execução Fiscal? Os recursos auferidos pela alienação judicial devem ser usados prioritariamente para o pagamento do credor fiscal ou devem ser utilizados para o pagamento dos credores trabalhistas?

Já podemos perceber que a adoção do entendimento da Segunda Seção, com todas as vênias, nos traz mais dúvidas do que soluções, em que pese a envergadura jurídica dos eminentes Ministros que a integram.

E os percalços dessa orientação jurisprudencial também deixam perplexos e atônitos os juízos recuperacionais, que nada fazem de concreto para a satisfação do crédito tributário, ainda que cientificados daquelas execuções fiscais, alicerçados nas premissas de que o processo de recuperação judicial não tem natureza executiva, não impõe a arrecadação de bens do devedor, não estabelece ordem de pagamento, não prevê a sujeição do crédito fiscal e tampouco há respostas seguras para todas aquelas perguntas mencionadas nos parágrafos anteriores.

Assim, aquela “penhora no rosto dos autos” ou o ofício comunicando a existência da execução fiscal se tornam “folhas mortas” nos autos da recuperação judicial, enquanto as execuções fiscais contra os devedores em recuperação judicial se transformaram em processoszumbis, sem alma e sem sentido, em face da ausência de operacionalidade da vigente orientação jurisprudencial da Segunda Seção do STJ.

  • A Tese Minoritária e seus Percalços

A Primeira Seção do STJ, sobretudo a partir de precedentes da 2ª Turma, nos julgados da relatoria do Eminente Ministro Herman Benjamin, propõe uma revisão da jurisprudência edificada pelas Turmas de Direito Privado. A conferir:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. SUSPENSÃO DOS ATOS EXECUTÓRIOS. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PRECEDENTES DO STJ.ATOS QUE IMPLIQUEM RESTRIÇÃO PATRIMONIAL. REEXAME PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ.

1. Consoante as Súmulas 282 e 356 da Suprema Corte, é inadmissível a apreciação em Recurso Especial de matéria não debatida e decidida pelo acórdão objurgado, tampouco suscitada em Embargos de Declaração, porquanto ausente o prequestionamento. 2. A Segunda Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.512.118/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, revisitou a jurisprudência relativa ao tema, para assentar o seguinte entendimento: a) constatado que a concessão do Plano de Recuperação Judicial se deu com estrita observância dos arts. 57 e 58 da Lei 11.101/2005 (ou seja, com prova de regularidade fiscal), a Execução Fiscal será suspensa em razão da presunção de que os créditos fiscais encontram-se suspensos nos termos do art. 151 do CTN; b) caso contrário, isto é, se foi deferido, no juízo competente, o Plano de Recuperação Judicial sem a apresentação da CND ou CPEN, incide a regra do art. 6º, § 7º, da Lei 11.101/2005, de modo que a Execução Fiscal terá regular prosseguimento, pois não é legítimo concluir que a regularização do estabelecimento empresarial possa ser feita exclusivamente em relação aos seus credores privados, e, ainda assim, às custas dos créditos de natureza fiscal.3. A constatação acerca dos meios pelos quais a execução pode ser promovida de modo menos gravoso ao devedor situa-se no âmbito da cognição de matéria fática, o que é inviável em Recurso Especial, em razão do óbice da Súmula 7/STJ.4. Recurso Especial não provido.

(REsp 1716048/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/05/2018, DJe 19/11/2018)

O grande crítica, hoje, desse entendimento, é o fato de que o juízo da execução pode causar um grande entrave ao cumprimento do plano de recuperação, com riscos para a preservação da empresa, ao deferir uma medida constritiva contra o patrimônio dos devedores em recuperação judicial, principalmente nas hipóteses de penhora online pelo sistema Bacen-Jud.

Até mesmo as penhoras de baixos valores, autorizadas por juízos distintos, quando analisadas em conjunto, podem se transformar num grande obstáculo, uma vez que os devedores em recuperação judicial têm enorme dificuldade de liquidez nas suas operações, decorrentes da ausência de linhas de crédito disponíveis no sistema financeiro.

Nessa toada, o fim maior da preservação da empresa estaria mais atendido se houvesse algum tipo de controle, em relação aos atos de constrição dos bens do devedor em dificuldades, por parte do juízo recuperacional. Vejamos:

AGRAVO INTERNO. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL.CRÉDITO CONSTITUÍDO APÓS O DEFERIMENTO DA RECUPERAÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO PARA OS ATOS DE CONSTRIÇÃO. DECISÃO MANTIDA.

1. A competência para o pagamento dos débitos de sociedade empresária ao longo do processo de recuperação é do juízo em que se processa o pedido de recuperação, tendo em vista que a manutenção da possibilidade de juízos diversos procederem à constrição dos ativos da sociedade nos planos previstos no Plano de Recuperação poderia comprometer o soerguimento da empresa. Precedentes desta Corte.2. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no CC 167.402/GO, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 05/05/2020, DJe 08/05/2020)

O maior desafio, portanto, é compatibilizar o princípio da preservação da empresa do devedor em dificuldades, previsto no art. 47 da LFRE, com a autonomia e eficácia das execuções individuais dos credores não sujeitos à recuperação judicial, em especial do credor fiscal, por força do 6º, §7º da LFRE.

  • Cooperação de Jurisdição e os Atos Concertados para a Preservação da Empresa

Atentos aos substanciosos fundamentos das teses antagônicas, construímos um posicionamento intermediário e harmonizador, que busca conciliar a efetividade do processo de execução fiscal com a competência do juízo da recuperação para supervisionar o destino dos bens do devedor, a fim de minimizar os impactos no cumprimento do plano e os riscos para a preservação da empresa.

E a solução instrumental vem de uma inovação do nosso novo Código de Processo Civil, aplicável à recuperação judicial por força do art. 189 da LFRE. Trata-se da Cooperação de Jurisdição, por meio de Atos Concertados, assim disciplinada nos artigos 67 a 69 do novo CPC:

Art. 67. Aos órgãos do Poder Judiciário, estadual ou federal, especializado ou comum, em todas as instâncias e graus de jurisdição, inclusive aos tribunais superiores, incumbe o dever de recíproca cooperação, por meio de seus magistrados e servidores.

 Art. 68. Os juízos poderão formular entre si pedido de cooperação para prática de qualquer ato processual.

 Art. 69. O pedido de cooperação jurisdicional deve ser prontamente atendido, prescinde de forma específica e pode ser executado como:

I – auxílio direto;

II – reunião ou apensamento de processos;

III – prestação de informações;

IV – atos concertados entre os juízes cooperantes.

§ 1º As cartas de ordem, precatória e arbitral seguirão o regime previsto neste Código.

§ 2º Os atos concertados entre os juízes cooperantes poderão consistir, além de outros, no estabelecimento de procedimento para:

I – a prática de citação, intimação ou notificação de ato;

II – a obtenção e apresentação de provas e a coleta de depoimentos;

III – a efetivação de tutela provisória;

IV – a efetivação de medidas e providências para recuperação e preservação de empresas;

V – a facilitação de habilitação de créditos na falência e na recuperação judicial;

VI – a centralização de processos repetitivos;

VII – a execução de decisão jurisdicional.

§ 3º O pedido de cooperação judiciária pode ser realizado entre órgãos jurisdicionais de diferentes ramos do Poder Judiciário.

Segundo nossa ótica, compete ao próprio juízo da execução fiscal determinar, num primeiro momento, a penhora ou qualquer outro ato de constrição contra os bens do devedor em recuperação judicial, por força do art. 6º, §7º da Lei 11.101/2005 e 187 do CTN.

Contudo, recaindo a penhora em algum bem que o devedor em recuperação judicial, ora executado, entenda como essencial, deve ele fazer um pedido de substituição do bem penhorado por outro que indicar, não essencial, ao próprio juízo da execução fiscal, com fulcro no princípio da preservação da empresa e da menor onerosidade, consoante posicionamento adotado pelas Turmas de Direito Público do STJ. Não se descarta a possibilidade do devedor apresentar qualquer outro tipo de garantia à execução fiscal, até mesmo bens de terceiros anuentes, fiança bancária e etc.

Não acolhido o pedido de substituição do bem penhorado, o juízo da execução fiscal deverá submetera questão, por meio de ato concertado previsto no art. 69, §2º, inciso IV do novo Código de Processo Civil, ao juízo da recuperaçãojudicial, a quem competirá decidir, em última análise, sobre o deferimento ou não do pedido de substituição, uma vez que é o responsável pela fiscalização de todo o processo de reestruturação daquele devedor em dificuldades, conciliando a solução a solução à preocupação da Segunda Seção do STJ.

A grande vantagem desse entendimento é o fato de que nem todos os atos de constrição recaem sobre bens essenciais e, portanto, não precisam ser submetidos ao crivo do juízo da recuperação.Por conseguinte, sem tornar estéril as execuções fiscais, caberá ao próprio devedor decidir quando será necessário o controle dos atos de constrição pelo juízo da recuperação, sendo certo que em muitos casos ele pode cumprir espontaneamente suas obrigações ou mesmo não enxergar qualquer risco para o seu processo de reestruturação no ato de constrição determinado.

Nós já apresentamos essa tese ao Poder Judiciário em diversos casos concretos, algumas vezes com êxito[4] e outras não, inclusive no rumoroso e complexo processo de recuperação judicial do Grupo OI, em tramitação perante a 7ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro[5]. Infelizmente, o nosso Agravo de Instrumento 0035450-38.2019.8.19.0000 não chegou a ter o seu mérito apreciado, justamente porque a questão está afetada à Corte Especial do STJ. Confira-se:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PRÁTICA DE ATOS CONSTRITIVOS. MATÉRIA AFETADA COMO REPRESENTATIVA DE CONTROVÉRSIA PELA PRIMEIRA SEÇÃO DO E. STJ NO JULGAMENTO DO RESP Nº 1.712.484/SP, N° 1.694.316/SP E N° 1.694.261/SP, SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS, NOS TERMOS DO ARTIGO 1.036, PARÁGRAFO 5° DO CPC/2015. TEMA 987. ORDEM DE SUSPENSÃO DA TRAMITAÇÃO DOS PROCESSOS EMANADA DA CORTE SUPERIOR DE JUSTIÇA. SUSPENSÃO DO TRÂMITE DO AGRAVO DE INSTRUMENTO ATÉ ULTERIOR DECISÃO DO C. STJ APLICAÇÃO DO ART. 1.037, II DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

1.Cuida-se de agravo de instrumento interposto contra decisão proferida pelo Juízo da Sétima Vara Empresarial da Comarca da Capital que, nos autos de recuperação judicial, assentou que os créditos de natureza fiscal não estão sujeitos à Recuperação Judicial (art. 6º, §7º), devendo sua execução prosseguir plenamente no processo de origem, ressalvado apenas a competência do Juízo da Recuperação para prática dos atos de constrição sobre os ativos da Recuperandas, o que pode ser solicitado por meio de carta ou ofício.

2.Ocorre que a Primeira Seção, do Superior Tribunal de Justiça, em 20.02.2018, no julgamento da ProAfR no REsp 1694261/SP, de Relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques, afetou o processo, juntamente com os REsp 1.694.316 e REsp 1.712.484/SP, ao rito dos recursos repetitivos descrito no Tema 987, no qual se discute a “possibilidade da prática de atos constritivos, em face de empresa em recuperação judicial, em sede de execução fiscal”.

3.Outrossim, foi determinada a suspensão nacional de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos (art. 1.037, II, CPC) que versem sobre a seguinte questão jurídica e que tramitem no território nacional.

4.Deste modo, tendo em vista que a matéria versada no presente recurso se insere ao objeto da suspensão determinada pelo Superior Tribunal de Justiça, impõe-se o sobrestamento do recurso até que seja proferida decisão no recurso especial em questão, em obediência ao princípio da segurança jurídica.

5. Suspensão do julgamento do recurso que se impõe.

(TJRJ, Agravo de instrumento nº: 0035450-38.2019.8.19.0000. OITAVA CÂMARA CÍVEL. Relatora: Des. Mônica Maria Costa Di Piero. Julgado em 29/10/2019).

Mas o tempo urge e não podemos ficar de braços cruzados aguardando o julgamento pela Corte Especial do STJ, mesmo porque as teses contrapostas podem ser conciliadas por meio da mencionada cooperação de jurisdição.

  • Conclusão

Em que pese os robustos argumentos das duas teses antagônicas em debate perante o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, ousamos propor uma terceira via como melhor forma de resolver o conflito.

Deve-se reconhecer a competência do juízo da execução fiscal para determinar a penhora ou qualquer outro ato de constrição contra os bens do devedor em recuperação judicial. Essa afirmação decorre não apenas do disposto nos artigos 6º, §7º da LFRE e 187 do CTN, mas também se apoia nas seguintes premissas:

1ª. A Recuperação Judicial, diferentemente da falência, não é um processo de execução coletiva;

2ª. Fere o bom senso permitir o prosseguimento de um processo executivo, inclusive o fiscal, sem a possibilidade de atos de constrição;

3ª. A recuperação judicial tem sido utilizada, por força da orientação jurisprudencial majoritária, como um eficaz instrumento de fraude fiscal;

Caso o devedor em recuperação judicial entenda que o ato de constrição tenha potencial para prejudicar o cumprimento do plano de recuperação, deverá pleitear ao próprio juízo da execução fiscal a substituição do bem penhorado por algum outro não seja essencial que indicar, obviamente, suficiente para a satisfação do crédito.

Caso o juízo da execução fiscal não acolha esse pedido, deverá submeter a questão ao juízo da recuperação judicial, por meio do ato concertado, previsto no art. 69, inciso IV, e seu §2º, inciso IV, do Código de Processo Civil, que poderá manter o ato de constrição original ou substituí-lo por outro que entender menos prejudicial ao processo de reestruturação da empresa, desde que suficiente para a satisfação do crédito exequendo.

Por fim, defendemos idêntica solução para as execuções individuais dos créditos privados não sujeitos ao concurso, em especial aqueles cujos fatos geradores são posteriores a data do pedido de recuperação judicial.

É, pois, como pensamos.


[1] Nesse sentido: REsp 1676028, Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES. Publicado em 20/06/2017.

[2]A Primeira Seção, por ocasião do julgamento dos Recursos Especiais nos 1.694.261/SP e 1.694.316/SP, afetou à Corte Especial.

[3]AgInt no CC 150.852/SC, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/06/2017, DJe 22/06/2017.

[4] Nosso parecer ministerial foi acolhido pelo MM. Juízo da 2ª Vara Cível da Ilha do Governador, nos autos do processo de execução nº 0013517-38.2017.8.19.0207, em que é exequente o SENAI e executado é o Estaleiro Ilha S/A – EISA – em recuperação judicial. A r. decisão da Exma. Dra. Juíza Viviane Vieira do Amaral Arronenzi, em 30/04/2020, foi nos seguintes termos: “Considerando que o crédito é extraconcursal, bem como o parecer ministerial de fls. 453/459 DEFIRO o pedido de penhora formulado pela parte autora e determino a expedição de ofício ao juízo da recuperação solicitando que separe e transfira o montante a ser pago nestes autos. Consiguine-se a possibilidade do Juízo da Recuperação Judicial promover a substituição do bem ou do ativo penhorado, quando reputá-lo essencial às atividades da devedora, por algum outro, desde que suficiente para a integral satisfação do crédito não sujeito ao concurso”.

[5] A síntese da nossa tese também foi encaminhada ao Senado Federal e à Câmara dos Deputados para ser debatida nos diversos projetos de lei que versam sobre as propostas de modificações da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005.

1 thoughts on “Execução Fiscal Contra o Devedor em Recuperação Judicial

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